Ignorantes vs. impacientes




Tenho um colega de trabalho que, em plena preparação para um novo turno, me chamou ignorante com todas as letras, sem qualquer pudor e apenas por eu não ter identificado uma marca de moda nuns brincos, sobre a forma dos quais usei o meu sentido de humor. Na verdade, repetiu-o quando o questionei, temendo eu que a obstrução nasal de que tenho sofrido me estivesse a afectar também a audição.
Não é a primeira vez que, em contexto laboral, ouço palavras descabidas, é certo, mas o que mais me chocou nesta abordagem foi o peso gratuito do insulto numa temática tão pouco consistente. Chegamos, como se vê, a um período de completa desconsideração, onde a crise e os seus sucedâneos são desculpa para a irritabilidade crónica de alguns, somada à frustração de outros.
Os resultados são estes que se fazem sentir. Uma crise sem precedentes, mas que se refere não aos bolsos e às contas bancárias, mas aos comportamentos e à perda de bom senso.
Orgulho-me de ter assassinado parte dos meus hábitos de procrastinação. Só isso explica todas as actividades em que tenho tomado parte, bem como o sucesso que nestas tenho alcançado. Sou, porém, forçado a concluir que nem todos se sentem agradados com isso.
Em boa verdade, poucos serão os verdadeiramente empáticos, o que me preocupa dado o facto da minha profissão ter a empatia como um dos pilares da sua existência.
Para quem trabalha de sol a sol e ainda acumula funções, sem que tal surta frutos que não sejam os monetários correspondentes à perda de qualidade de vida, não será fácil ver o colega do lado ganhar motas com poemas, lançar livros, ser convidado a apresentar eventos, ter uma actividade cultural activa e reconhecida nos meios em questão...
Descansem! Tudo isto acontece sem recorrer a fórmulas mágicas. É apenas fruto de dedicação e trabalho. Um trabalho que vai mais além e não se limita à repetição das mesmas funções incessantemente até ao (quase) inevitável automatismo irracional.
É resultado da dedicação de anos, de estudo, da observação do comportamento dos que se envolvem e fazem com que outros se envolvam. Deve-se a uma impaciência crónica. Por isso, deixem de ser pacientes e mexam-se.
No Brasil, a impaciência deu lugar a revoltas inimagináveis. Um país de economia emergente, mas que sai à rua para reivindicar os seus direitos e apresentar as suas convicções perante as assimetrias sociais, os discursos vazios da corrupção e a demagogia política.
Serão eles ignorantes? Não. São impacientes, porque esta é uma característica dos que não se conformam.
Afinal, diz o ditado que "quem não se sente..."

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