Orgulho

A noite nunca é escura de mais para pensar. Os pensamentos podem ser escuros de mais para a noite. Assim como as manhãs cobertas de nevoeiro que todos, receosos, enfrentamos com coragem, assim é cada passo no desconhecido.
Se por um lado o nosso cérebro nos diz que temos de segurar a intenção e ficar, o mundo grita-nos que temos de ir. Quem fica, fica para trás. O nosso mote é andar.
Ficar parado não é só não sair do sítio. É não estudar, é não ler, é não ser cada dia um pouco mais do que na véspera.
Podemos ser piores amanhã desde que sejamos outros. 
Hoje, ao procurar alguns dos posts que o Fiel Depositário me guardou ao longo destes anos, percebi que no meio de alguma anarquia vive a minha memória. 
Quem desejar perceber um pouco mais quem sou, para além daquilo que sou, pode ler este blog. 
Percorri algumas linhas. Não há uma única palavra que me pareça ridícula. Há algumas que são mais jovens, outras mais maduras, mas todas são um peito aberto à realidade. A minha realidade.
Há palavras que me surpreendem até. Talvez para meu próprio bem não devesse tê-las escrito tão cedo, mas as palavras são necessidades. São forças universais que nos usam para se movimentar entre si, que nos convocam para algo que tem tão pouco de esotérico como de terreno.
Somos todos parte da química e da física que nos fazem seres unívocos, mas há algo de divino nestas leis. O divino somos nós e as magias que criamos dentro das nossas limitações. 
Tenho explorado imensos caminhos na minha vida. Por vezes, há um ligeiro cansaço que desperta e me diz que não há problema em ficar quieto. EIs que o ímpeto se revolta e reafirma que quem fica, fica para trás.
Podia mudar algumas formas que delineei nos meus dias passados. Não mudaria conteúdos. Isso sera alterar tudo o que me trouxe até aqui. Como as pausas num texto, as vírgulas, os pontos finais, a gramática, sou o produto de erros, fissuras, hesitações. Para além disso, há o outro lado. As palavras. Sou, definitivamente, o resultado das palavras.
Das palavras que proferi a um doente, das palavras que escrevi num caderno, das palavras que gritei, das palavras que sussurrei, das palavras que gemi…
Aquilo que li mostrou-me um rapaz que às vezes esqueço. Um homem que às vezes esquece que olhar para trás não é necessariamente ficar. Quem fica, fica para trás, mas quem olha para trás tem direito a orgulhar-se do que fez.


Hoje, ao ler-me, senti orgulho. Estou orgulhoso deste homem que fica orgulhoso com aquele rapaz.

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