O talento e o seu lugar

Já passou uma semana desde que visitei a capital para assistir a um congresso organizado pelo Conselho de Enfermagem. Ainda hoje não tive a coragem de passar tudo isto para o papel, se é que de coragem se trata, uma vez que as recordações, muito boas por sinal, podiam perder as virtudes. Nunca perdem, acabo sempre por concluir, mas a verdade é que assim também sabe bem. Falar a uma certa distância de algo de que gostamos reforça a nossa ligação com isso. Hoje é, por isso, como se regressasse lá.
Não pretendo exceder-me nas descrições. Essas são mais privadas, mais íntimas, e ficam registadas no diário de viagens que mantenho. Mas há notas que, independentemente da sua extensão, têm de ser deixadas aqui.
Em primeiro lugar, Lucília Nunes. Suprimo, propositadamente os títulos porque é a pessoa que me interessa. Afinal, tenho nos protocolos um pequeno ódio de estimação. Lucília Nunes é possuidora de um currículo muito completo e diversificado, mas a sua principal arma é ser dotada de uma qualidade oratória brilhante. A clarividência daquilo que diz, a forma como o faz e a noção de que o faz bem levam-na a cometer alguns excessos quando, por exemplo, comenta outras intervenções. Contudo, os excessos que possam ser cometidos são diluídos na fluidez das palavras com que nos embala, mas sem nos dar sono. Identifico-me com os elogios e com as críticas que lhe fazem. Também eu tenho sido elogiado por falar mas criticado naquilo que digo. Deixo, pois, aqui os meus parabéns.
Na segunda noite que passei em Lisboa, a noite de 23 para 24 de Novembro, fui jantar ao Café do Museu, contíguo ao Museu do Fado. Fui lá a convite de José Cid e tive a oportunidade de o conhecer. O mesmo aconteceu com Herman José e Susana Cacela, que ali estavam para cantar o fado, com César Mourão e Fernando, membro do St. Dominic’s Gospel Choir, e com artista Henrique Gabriel e seu filho. No lote de assistentes estavam ainda João Gil, Rui Pregal da Cunha e muitas outras caras conhecidas. No entanto, o facto de o estatuto social destas pessoas ser aquele que se conhece é algo que não me fascina. Por outro lado, fascina-me o talento. Há, tenho a certeza, muita gente que se convencerá do contrário, que é conhecimento que vale. Porém, é o reconhecimento que mais conta. Este perpetua-se, o outro esmorece ao fim de algum tempo.
Posso acrescentar que fui recebido por todos como se fizesse parte de tudo quando, em boa verdade, estava deslocado. Ainda assim, sentia-me perfeitamente e pude, como sempre se pode, aprender alguma coisa.
Ficam alguns contactos que espero não se percam, pelo gosto que tenho em conversar e pelo prazer que tenho em verificar que o talento, como o saber, ocupa um lugar sem limitações de espaço.

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