Destinos

O entusiasmo antes de se viajar nasce, como é óbvio, das expectativas criadas. Florença é o berço daquele momento histórico em que o Homem, sentindo-se plenamente capaz, assume a sua posição central no Mundo. Foi lá que nasceu a figura do génio completo, aquele que sabe um pouco de tudo, capacidade que hoje tendemos a descurar através da incessante procura na especialização.
Florença é, talvez, o melhor local que eu, à data da marcação da viagem, podia ter escolhido. Sinto-me, portanto, feliz. Contudo, não totalmente. Não é só o entusiasmo que gera raízes, também nós as temos. E grandes, porventura.
Ao viajar deixo um pouco de mim para trás. Deixo aquilo onde toco diariamente, onde trabalho e penso, deixo os objectos que me ouvem e que me levam até ao lugar dos "nossos" sonhos. Deixo pessoas. E deixo A Pessoa. Se o coração falasse e pudesse ser independente, este escravo estranhamente indispensável que trabalha sem parar até ao nosso final, pedir-me-ia para o deixar. Pedir-me-ia para fazer a mesma viagem de sempre, não de avião mas de automóvel, seguindo pela autoestrada à velocidade do sentimento e regressando, já noite, na lentidão do sono perdido. Pedir-me-ia para o deixar estar em paz, pousado numa varanda dessa pequena terra mascarada, onde as festas permanente são o sal do ritmo de vida.
Não o posso deixar. E como tenho de o levar comigo, sei que ele traz também aquela lembrança, aquele sentimento forte como um penedo e de porte enorme. Sei que ele o fará por ter vontade própria. Sei que ele se lembra de ti. E eu, pessoa diferente de um coração que nem controlo, estarei lado a lado com ele, a conversar sobre aquela rapariga que todos os dias me mostra que a viagem principal tem o amor como destino.

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