Conto

Mais uma vez, um conto:

A Flor e o Inverno

Era uma vez o Inverno. O Inverno, frio e incontrolável como é, começou a tornar-se triste. Sentia-se a falhar, sentia que já não era necessário ou, pelo menos, tão fundamental como todas as outras estações.
Certo dia, andando com o frio bem à mão, o Inverno viu, bem perto de si, nascer uma Flor. O seu coração congelado começou a aquecer. Primeiro, lentamente e a medo. Depois, reagindo, foi-se aproximando e falou-lhe.
- Olá, flor! Não tens frio? Sabes, nunca pensei que alguém pudesse nascer tão perto do meu coração gélido, quase glacial, mas tu…
Não teve coragem de continuar. Ela tinha começado a mostrar-se a luz do dia. As pétalas, uma após outra, foram-se abrindo. A cor que a preenchia era inqualificável. Era vermelha, daquele calor que ele sentira; era cor-de-rosa, da fragilidade e da sensibilidade; era verde, da esperança; era branca, da pureza. Revelava-se lentamente e, talvez por isso, o coração do Inverno batia cada vez mais acelerado. Quase não conseguia respirar, tal era a força com que o coração batia. Tudo por estar perto dela.
Ela ia sorrindo. Cada pétala era mais um sorriso, uma amostra de toda a sua simpatia. Contudo, ele sentia-a distante. Estariam trocados os papéis? Seria ele o quente e ela o frio? Não, era uma ideia que não lhe agradava. Afastando-a continuou, compenetrando-se no espectáculo a que assistia. Ela nascera e agora florescia. De repente, como que num último esforço simpático e terno, a Flor mostrou-se completamente ao Inverno.
Perguntou ele:
- Não temes morrer com o meu frio?
A Flor respondeu:
- Com essas lágrimas não.

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